Poema concebido em joão pessoa [pb/BRA] ago./2006
Argollo Ferrão, A. M. de (2006). Mãe preta acode [web]. Disponível em <http://argollo.org/antologia/poetica/mae-preta-acode/>.
Mãe preta acode
Acode, Mãe preta,
Quem pode imaginar o ser
Maravilhoso que a senhora é...
Tão gorda e plena, amorosa e matronal,
Tão bela mulher isenta de lascívia,
Que acolhe gerações de homens alheios,
Sedentos dos teus peitos, sagrados seios,
A se alimentarem vorazes, quase sem freios,
Como nossos pais - e antes deles, os teus
A te sugarem toda e por todos os meios.
Acode, Mãe preta,
No teu colo, meninos que se aconchegam
Para ouvir a tua voz rouca, carinhosa e ritmada
A contar belas histórias de além-mar.
Diga-me, Mãe preta,
O que mais terias a oferecer
A este pobre "sinhozinho"
Sem terras, sem gado, sem ninho,
Que para aliviar seus tormentos
E a sensação de estar sozinho...
Recorre à memória de um século malpassado.
Acode, Mãe preta,
Com uma poção, um pão-de-ló abençoado,
O leite do teu peito seco - requentado,
Oh Mulher-espelho que reflete a dor
De quem só quer ser amado...
Anteparo da ação mais violenta,
Impensada, sem razão,
Mãe preta dos homens de bem,
Sem rosto, sem corpo, sem coração,
Mãe preta do meu Brasil — Acode e nos dê a mão !