Deusa ausente

Poema concebido em Campinas [SP/BRA] ago./2006

Argollo Ferrão, A. M. de (2006). Deusa ausente [web]. Disponível em <http://argollo.org/tri/tri3/tri3-24/>.

ISBN 978-85-908725-0-4 / Publicado em 2008

Argollo, A. (2008). Deusa ausente. In A. M. de Argollo Ferrão (Ed.). Entre símbolos e a perfeição (pp. 28-29). Campinas [SP/BRA]: O Autor.

Deusa ausente
Havia mais que um motivo para eu comemorar
Mas comemorei sem motivo algum,
Beijei a boca da morena mais bonita do bar.
Beijei e fui-me embora – beijei por beijar...

E a paquera rolou solta a partir de então,
Mas a aura era a de uma cerimônia crepuscular:
Fim de festa, fim de mundo, fim da poesia
E da necessidade de se dizer sim ou não.

As pessoas pareciam entender o ritual,
E estendiam-me tapetes vermelhos...
Baixavam os olhos, dobravam os joelhos
Como se minha majestade fosse a coisa mais natural.

Senti que ali jamais conquistaria o coração de minha deusa
Tranqüila, quieta, cheia de si,
Agraciada por divinas benesses da natureza...
Deusa ausente, gélida, distante como nunca vi.

Rompi as etiquetas básicas de comportamento em sociedade
E decidi cair na gandaia,
Certo de que sem a deusa por perto
Eu encontraria uma mulher de verdade...

Que balançasse meu coração
E que parasse o trânsito
Quando se dirigisse à praia...
Ou saísse para dar uma volta no quarteirão.

E a eterna busca por essa deusa ausente arrebata
Uma multidão de imbecis em estado hipnótico
A fim de identificar uma abertura, um sorriso, um sinal qualquer
De amor, para obter a paz – no mais puro ato erótico (herético, heráldico).